SINDICATO DE ATLETAS PROFISSIONAIS DO BRASIL
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Entrevista do presidente Osni Lopes para o Bahia Notícias

19, OUTUBRO 2018 às 07:21:22

Durante a carreira de jogador, em que vestiu as camisas de Bahia e Vitória, o ponta direita Osni fugia da marcação dos zagueiros adversários. Com as chuteiras penduradas, ele se tornou presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais da Bahia (Sindap-BA) e agora é ele quem marca duro os clubes para defender os direitos dos jogadores que estão em atividade. Recentemente, Osni entrou em campo denunciando o Conquista, Galícia e Teixeira de Freitas, que disputaram a última edição da Série B do Campeonato Baiano, por darem calote nos seus jogadores. No escritório do Sindap-BA, localizado no bairro do Stiep, em Salvador, o ídolo da dupla Ba-Vi recebeu a reportagem do Bahia Notícias para uma entrevista revelando a dura vida da maioria dos jogadores de futebol. Segundo ele, a chance de um garoto se tornar um atleta de ponta e ganhar um bom salário no mundo da bola é a mesma de acertar os seis números da Mega-Sena.
 
No último dia 22 de maio foi noticiado que o sindicato entraria com ação contra três clubes que disputaram a Série B do Campeonato Baiano, por atraso de salários. A entidade de fato deu entrada na ação?
 
Desses seis clubes que disputaram a Série B do Baiano, o Conquista, o Galícia e o Teixeira Freitas estão com dificuldades terríveis para pagar os jogadores. O Teixeira de Freitas, depois de muita coisa, parece que está pagando. Eu venho aqui batendo, agradeço muito à imprensa pela força. A repercussão que tem isso no meio de comunicação é impressionante. Todo mundo me ligando, já vínhamos conversando e parece que o Portela [Teixeira de Freitas] já se acertou com a maioria dos jogadores e estão se acertando com o restante. O Conquista também me ligou e disse que vai acertar, está dependendo apenas do dinheiro da Prefeitura, que se receber também vai acertar. Mas a situação do Galícia eu tenho pena, porque é um time que gosto muito. Todo torcedor daqui de Salvador, quando não era Bahia ou Vitória, era Ypiranga e depois Galícia. Parece que tinha um empresário que estava ajudando o Galícia, mas deixou de ajudar depois. É sempre assim, é uma confusão no Galícia que a gente não entende e aí não está pagando. Já tenho uma carta do Ministério Público pedindo informações sobre o Galícia, se está cumprindo, e eu tenho que falar a verdade... Vamos dizer que o Galícia não está cumprindo, apesar do diretor jurídico ter me ligado, dizendo que vai acertar. Que vá ao MP-BA e faça um TAC [Termo de Ajustamento de Conduta], como o Vitória da Conquista já fez. O Serrano agiu corretamente: estava em situação difícil, pediu licença e disse que só volta quando tiver dinheiro. É assim que tem que fazer. Ypiranga e Leônico também pediram licença. É melhor pedir licença do que querer entrar sem dinheiro, porque se a primeira divisão já é difícil tendo dinheiro da televisão, imagine essa segunda divisão que não tem dinheiro de nada, só do patrocínio? Aí fica dependendo de políticos, de abnegados da cidade. O Atlético [de Alagoinhas] conseguiu os abnegados da cidade. A gente sabe os três da Série B que pagaram. O PFC-Cajazeiras é do deputado [estadual Marco Manassés], que pagou religiosamente bem. Inclusive pagou hotel e tudo, tem conseguido dar o necessário dentro das condições da segunda divisão. O outro que pagou foi o Colo-Colo, que teve dificuldades e eu já tive problemas sérios em anos anteriores. Mas parece que já está acertando as dívidas anteriores, porque arrumou um grande patrocinador e fez uma segunda divisão muito boa. Soube que pagou direitinho, não tive queixas. Quando tem alguma coisa errada, a gente já recebe logo o telefonema, como aconteceu com o Conquista, Galícia e Teixeira de Freitas. Então, temos certeza que foi tudo bem. Agora mesmo, o Jacuipense foi chamado numa audiência no Ministério Público para fazer um TAC. Acho que não há tanto problema, pois Felipe [Sales, presidente do clube] paga pouco, mas fez um grande campeonato na Série D. Colocou alguns jogadores mais experientes como Uelliton e se tivesse investido um pouco mais chegava. Bateu na trave, faltou aquele algo mais.


Como é feita essa fiscalização do Sindap junto aos clubes? Teve clube alegando que a situação de atraso não era aquela que o Sindap estava falando. Vocês consultam também os clubes?
 
Aqui tem oito clubes que disputaram o Campeonato Baiano, tirando Bahia e Vitória. Se eu pedir, Bahia e Vitória me dão uma planilha contendo quantos minutos cada jogador esteve em campo, dão tudo. Mas para esses daqui (os outros times baianos), somos obrigados a ir ao site da Federação Bahiana de Futebol e tirar aquelas duas ou três páginas de súmula. A gente passa 40 dias trabalhando, puxando as súmulas de cada jogo do campeonato para depois tabular jogador por jogador, porque os clubes não têm nada e não passam nada. Você não tem contato com nada. Eu não sei onde é a sede do Bahia de Feira, nem quem é o diretor responsável. Eles não entram em contato. A gente só consegue ter essa planilha porque vamos à súmula da Federação. Sempre tem um jogador que telefona para a gente, que já nos conhece e que já faz parte de outro clube. Hoje em dia a melhor coisa do mundo é isso aqui  [aponta para o celular]. Quando ele liga e pergunta pelo direito de arena, eu falo que só vão pagar em setembro, mas vamos adiantar o pagamento só quando eles estiverem com todos os jogadores listados. Aí partir daí o nosso telefone não para de tocar e começamos a fazer o cadastro de todos eles, com nome completo, número da conta bancária, CPF... Mas os clubes não passam nada. Nós é que temos que fazer a planilha através da súmula da Federação. Quando a notícia [dos atrasos de salários] caiu na imprensa, os clubes começaram a me ligar dizendo que iriam pagar.
 
 
Qual o papel da FBF nessa questão dos atrasos? Ela auxilia ou medeia as negociações entre clubes e jogadores?
 
A responsabilidade é do clube. A Federação é gestora. A gente não fica crucificando a Federação. Eu não sou de ficar atirando. Tem muita coisa errada que ela poderia ajudar, principalmente em termos de premiação de campeonatos. Enfim, ajudar de alguma forma e que a gente sabe que vai acontecer para o ano e não é pela mudança de poder, pois isso já faz parte da própria diretoria dele [Ednaldo Rodrigues, atual presidente da entidade]. Já tem esse pensamento, mesmo se ele continuasse. Já ia mudar e tenho certeza que ele vai mudar, porque ele também sabe que a cobrança é grande. Ele cobra a porcentagem dele, por direito, em cima do líquido. Ele também precisa rever a possibilidade dessa cobrança, já que os árbitros são pagos pelos clubes e às vezes não tem renda do estádio suficiente para pagar. Ou então ajudar de outra maneira, como melhorar o valor da televisão, arranjar um patrocínio maior, conseguir alguma coisa que ele já tentou. Tentou novamente através da promoção da nota fiscal [Sua Nota é um Show], que para os clubes foi muito bom. Só que hoje em dia, depois que virou nota fiscal eletrônica, perdeu o interesse, pois não tem mais sonegação. Antes era bom para o Estado, porque o torcedor exigia a nota fiscal até de um cafezinho para ganhar o ingresso. Hoje não precisa, porque a evasão de impostos é bem menor. Ainda consegue uma coisa ou outra num mercadinho, mas é uma coisa bem menor, é bem pequena essa evasão fiscal hoje em dia. Ele tentou voltar com essa promoção, mas o governo não tem mais interesse. E agora ele tem que arrumar outra maneira para ajudar os clubes, porque senão eles vão falir, vão ficar sempre devedores e isso é ruim para ela [FBF]. Não pense que é bom para ele, porque sofre críticas. Eu cobrei dele na primeira vez, que me respondeu: "Eu falei para ele não entrar que não  conseguiria pagar". Ele alertou aos clubes devedores e disse para não entrarem. Só que os clubes alegaram que tinham patrocínio. Se ele fizesse o certo, só colocaria três clubes na disputa da Série B. Mas isso é brincadeira, é uma vergonha para o Brasil todo. As Séries A2 e A3 de São Paulo são grandes e têm transmissão das tvs estatais de lá. Aí, no fundo, ele tem que ceder. O clube não paga e isso queima o filme da Federação. Queira ou não queira, ele é criticado. Os times do interior não podem ter somente a televisão como fonte de renda. Eles têm que ter o mercadinho, a padaria, tem que fazer essas coisas.
 
 
Muitos garotos sonham em ser jogador de futebol acreditando em se tornar um novo Neymar, jogar em grandes clubes do Brasil e da Europa e ganhar muito dinheiro. Como é a realidade para a grande maioria dos jogadores de futebol profissional?
 
Os clubes vendem ilusão. Ganhar numa Mega-Sena é a mesma coisa que ser um atleta de ponta. Quando eu falo atleta de ponta é um jogador de Série A, porque você sabe que um jogador dessa divisão ganha o suficiente para se manter e fazer um patrimônio, se ele tiver cabeça. Série B também. Cerca de 82% dos jogadores ganham até 1 salário mínimo. O pior é que eles deixam de estudar, deixam de ter qualquer profissão, porque o sonho de jogar futebol é grande. Então, eles se dedicam só àquilo e muitos adquirem família, quando casam, arrumam filho. Vamos botar que ele ganhe mil reais, que dá R$ 12 mil por ano, né? Mas ele não joga o ano todo. Quando joga muito é por seis meses. Então é R$ 6 mil por ano e quando recebe os seis meses, porque às vezes não recebe. Aí R$ 6 mil dividido por 12 dá R$ 500 por mês. Isso é salário? É melhor ele ter a profissão dele. Estamos falando de 82% dos atletas. Outros recebem de 1 a 5 salários mínimos. Quem recebe de R$ 10, 50 mil em diante é só um pouco mais de um 1%. Se você analisar, é um negócio que não tem cabimento. É difícil sobreviver do futebol. O futebol brasileiro engana muita gente e o que é pior, a qualidade diminui, porque são clubes sem expressão. Se analisar, tem clubes sem expressão. Pega a Série D e olha os nomes dos clubes que não vão para lugar nenhum. Aquilo está vendendo ilusão e fica a CBF, Ministério do Trabalho lá em Brasília e tudo, dizendo que é emprego. Que emprego? Isso é emprego?! Isso faz com que o coitado tenha sete, oito, dez anos de profissão que quando termina não sabe de nada. Aí vira alcoólatra, a mulher abandona, a família abandona e vive na sarjeta. Era muito melhor dar numa profissão de verdade. Era muito melhor ele ganhar um salário mínimo trabalhando, com FGTS garantido e depois se aposentar. Jogador de futebol é a mesma coisa de qualquer outra profissão, mas ele tem dez anos de carreira e se aposenta com 35 anos. Quem é que vai pagar os outros anos? Aí ele perde e não consegue se aposentar nunca. Tem vários e vários jogadores que não sabem o que é aposentadoria. O Campeonato Intermunicipal [competição de times amadores] é a melhor coisa para quem tem outra profissão, porque ele ganha muito mais do que um jogador profissional.
 
 
O Sindap ajuda ex-jogadores que estão nessa situação? E também ajuda os atletas que ainda estão na ativa, mas passam por necessidade?
 
A parte social sempre é feita, apesar de eu ser muito sincero: eu não divulgo a parte social que eu faço. Acho que não tem coisa pior no mundo você ajudar um ex-jogador. E eu faço isso, mas não é com prazer, não. Quando um ex-atleta está necessitado, é uma dor no coração terrível. Eu sei que ele está nesse estado porque não teve oportunidade, ganhava pouco e depois não teve qualificação suficiente. É isso que a gente fala, qualificação para outra profissão. Não são todos que estão preparados. Da minha época, 90% dos jogadores estão em situação difícil. A gente vê até jogadores que jogaram em Seleção Brasileira. O cara tem um poder aquisitivo, tem uma vida, ganhando 50 salários mínimos, mas daqui a pouco, ele passa a ganhar um salário mínimo. Como ele vai sobreviver? Ele acostumou a família naquilo. Não consegue manter e começa a cair. A primeira coisa que perde é o casamento, perde os filhos e cai na bebida. É uma situação muito delicada. Eu tenho pena dos jogadores atuais que não são de Bahia e Vitória, porque estes últimos não me preocupam. Esses grandes clubes têm departamento médico, CT, boa alimentação, ficam em bons hotéis, viajam em ônibus confortáveis, viajam de avião. O que me preocupa são os times de menor expressão, que a gente sabe que não tem o ano todo de emprego e ganham muito pouco.
 
 
O que fazer para mudar esse cenário atual do futebol brasileiro?
 
O futebol tinha que ser quatro divisões, A, B, C e D, com competição que disputasse o regional, depois o nacional e que tivesse o ano todo. Aí teria emprego para o ano inteiro. Vai diminuir o número de clubes? Vai, mas pelo menos todos teriam salários dignos e nós teríamos melhor qualidade técnica. Se você analisar, a maioria dos jogadores não vai para lugar nenhum e às vezes bons jogadores ficam perdidos, pois caem nas mãos de empresários que colocam o jogador errado no clube. Isso acontece. Às vezes ele pode ir para um clube que pode dar condições, visibilidade maior, mas acaba indo para um clube pequeno. Teve empresário que colocou o jogador lá em Sergipe e o cara não tinha a mínima condição, não tinha nem o que comer. Então, fica difícil. O empresário bota, porque ele precisa botar, pois quer o emprego. Aí o atleta vai para um lugar para não receber e passar necessidade. E outra, você já viu empresário pegar jogador que não tem fama? Eu nunca vi. Claro que tem empresários que ainda arriscam, mas são pouquíssimos. Eles só querem pegar jogador que vai dar condições para ele. Ele emprega e quer o retorno, lógico! Pois ele é empresário e também investe com viagens para negociar com o clube. Ele também quer ganhar, vive de ganhar com jogador. Mas tem jogador que não vai dar nada. Ele vai botar jogador para ganhar R$ 2 mil? O que ele pode ganhar? Ele não vai ganhar nada. Ele não tem nem coragem de pedir para o jogador. Ainda por cima o atleta não recebe, passa por necessidade e pede a ele, que ainda vai ajudar o jogador. O problema todo é esse. O pessoal fala para mim, que eu vou desempregar as pessoas com essa mentalidade. Não, não vai desempregar. Vai ter o [Campeonato] Intermunicipal, o campeonato de várzea como tinha antigamente. São Paulo tem vários campeonatos de várzea que a televisão passa direto e dá dinheiro. Tem os campeonatos de várzea milionários, que Garrincha jogava naquela época e hoje os profissionais que já pararam vão para lá para ganhar. Em cada joguinho, o pessoal coloca mil reais no bolso. Aqueles clubes têm condições, porque são de empresas. Infelizmente, aqui na Bahia nós não temos mais, pois não temos nem campo! Sou a favor que qualifiquem os clubes. Se não podem botar 10 clubes no campeonato em condições de pagar aos atletas, que coloque seis. Faça um campeonato maior, faça um campeonato de ida e volta, que classifique quatro, faça o quadrangular, faça qualquer coisa, mas não bote 10 que não tenham condições, sabendo que depois não vão pagar.
 
 
E como melhorar a situação financeira do futebol baiano? 
 
Os clubes precisam se organizar e se profissionalizar. Não adianta nada só querer que a Federação faça, reclamar com a imprensa... Eles também têm que se organizar, mas não querem. Só querem receber através do seu presidente da Federação e fazer uma cobrança maior. Mas eles também têm que dar. Chegam lá no campo e não se organizam. O gramado não está bom, está faltando isso, faltando aquilo... Tem que se organizar, porque isso daqui é profissionalismo. Aí chega lá, o presidente do clube é inimigo do prefeito da cidade e não vai para lugar nenhum. Quando ele é amigo ou está do lado do prefeito, a prefeitura marca o campo, pinta a arquibancada, arruma o vestiário, coloca pia, vaso sanitário, mas quando não é... Infelizmente, o futebol é político também. O cara tem que ter a padaria que dá o café, o leite, o pão. No outro, ele tem que ter o mercado forte que dê toda a alimentação, tem que fazer dessa maneira. Agora se o cara é inimigo, entra em política, é contra o prefeito, não vai ter nada, pode ter certeza. Às vezes, o dono do mercado também é do lado do prefeito, aí ele também não ajuda. Os clubes que não tiverem estrutura não vão para lugar nenhum. Bahia e Vitória também dependem de política.
 
 
Quando um atleta de um time pequeno se machuca, ele recebe assistência do clube? O que faz o Sindap numa situação em que o atleta fica desamparado?
 
O sindicato entra quando toma conhecimento. Outro dia fiquei sabendo de um atleta que se machucou em Recife e acabou sendo operado lá pelo Sport. Foi operado com o médico do Sport, onde jogou na divisão de base e botou pelo SUS. A maioria daqui, que é a briga nossa, não assina a carteira e não recolhe o INSS. Quando precisa pegar um atleta desse contundido, você bota ele para ficar recebendo o salário pelo INSS e por lá ele vai ser operado. Mas se não paga, não pode encostar pelo INSS. Então, o jogador fica desamparado, sem salário, sem emprego e sem receber pelo órgão, que era um direito do atleta. É essa briga que temos o tempo todo para assinar carteira. Isso é o mínimo. Se você paga mil reais a um jogador, que não é nada, o que é 8% de FGTS? O INSS também é pouco. Empregada doméstica também não tem esse direito? Por que os clubes não cumprem com isso, já que eles pagam praticamente o que ganha uma empregada doméstica? Porque na hora que tiver um problema desse é até melhor para o clube, pois o atleta vai ficar recebendo pelo INSS e tenta operar pelo SUS. Aí não fica o jogador abandonado, porque terminou o contrato. Já teve jogador que veio do Sul do país, mas acabou sendo tratado aqui pela gente, fazendo fisioterapia. Ele era baiano, mas nunca jogou aqui. Não dá para a gente cuidar de todo mundo. É obrigação do clube cuidar do atleta, já que foi ele que contratou.
 
 
Como e quando começou o Sindap e como surgiu a ideia?
 
O sindicato tem muita história. Eu sou um dos fundadores, a gente briga desde 1978. Veio Rui Porto, Márcio Guedes, Piazza, os clubes dos interiores para o Ministério do Trabalhado. A AGAP era a Associação de Garantia ao Atleta Profissional. Não era nada demais. Os clubes começaram a minar e não conseguimos sala, nada. Fundamos, mas não foi para frente. Quando parei de jogar em 1986, nos reuníamos toda segunda-feira para conversar. Aí fundamos a GAP. Aí prometeram sala na Federação. Quando fomos ocupá-la, que precisávamos de um telefone e fax, a ABCD pediu e ficaram com nossa sala. Aí mudou de AGAP para Sindicato. Mas nessa época quem ficou à frente foram jogadores que ainda estavam em atividade, mas não foi para frente, porque eles não podiam brigar com Bahia e Vitória, se jogavam lá. Ficou até 2004, quando Emerson, que jogava de lateral esquerdo, foi para Brasília, mas não deu em nada. Até que a gente tomou o Sindicato através de uma intervenção em 2011. Aí nos filiamos logo na Federação, já começamos a tentar a alugar. No início, a gente trabalhava nas nossas casas, dentro do carro. Quando chegou em 2012 alugamos uma sala, pedimos para a Federação, que nos ajudou, e compramos as coisas mais simples e estamos aqui trabalhando até hoje. Isso aqui é muita responsabilidade.
 
 
Qual é a fonte de renda do Sindap-BA?
 
É a administração de tudo que vem para pagar a imagem dos jogadores e vivemos com os 10% desse montante. O dinheiro do sindicato sai somente do valor pago pela televisão, mais nada. O sindicato não arrecada mais nada do que isso. Não cobro mensalidade deles, que iria ajudar muito. Mas eu só poderia cobrar mensalidade de Bahia e Vitória, como vou cobrar dos times pequenos? Aí não. Acho que a porcentagem é obrigação da gente se manter. Se não der, paciência... Já está ficando difícil. Se analisar aqui, Campeonato Baiano não dá nada para a gente, Copa do Brasil melhora um pouco se os clubes chegassem perto da final. Copa do Nordeste é pouquíssimo! Só é bom para o campeão e é só para quem ganha, pois o dinheiro não vem para cá. O Bahia recebeu R$ 2 milhões, mas o prêmio vai direto para o clube. Ele acertou com os jogadores e o que veio para o Sindicato foi somente o direito de arena de R$ 70 mil e nós ficamos com R$ 7 mil pelo ano todo. O correto era o prêmio vir para eu distribuir o dinheiro. O Esporte Interativo é uma máfia. Eles não gostam de pagar. Eu entrei na Justiça contra o Esporte Interativo, o Bahia, o Vitória e Rede Globo de Televisão. É uma briga séria, porque as diferenças do direito de arena não são realmente o que a Globo paga aos clubes ou o que os jogadores têm direito. Eles pagam sob duas rubricas que são para o canal aberto e o fechado. Mas cadê a internet? Cadê os jogos que ela vende para fora? Cadê as placas na beira do estádio que só botam no dia do jogo? Tudo aquilo a Globo vende e não repassa. O EI deu R$ 40 milhões pelos jogos do Bahia de 2019 a 2024. Desse total, 5% era dos atletas, mas o EI disse que não, que era um dinheiro que ele deu ao clube pela assinatura do contrato. Por isso está na Justiça. Já a Globo, quando paga a luva, paga também os 5%. O EI recolheu logo 5% do INSS, porque é lei. Mesma coisa são os 5% dos atletas. Ela tinha que descontar também. Eu estaria com esse dinheiro para pagar aos jogadores. Em 2019, jogou você, você e você, toma aqui. Em 2020, o outro tem tanto e assim pelos anos todos. E vai entrar mais dinheiro ainda em 2019, porque isso só foi de luvas. Tivemos várias reuniões, fui para o Rio de Janeiro várias vezes. Isso é que aborrece. Fomos várias vezes lá com a Federação, sentamos na mesa com o direitor do canal. Teve uma vez que ficaram 1 ano sem pagar... Eles são ruins. Eles entraram, mas ainda não tem o "know-how" como tem a Globo. No fundo, no fundo eles querem é vender. Entraram para ganhar e para revender. Eles querem é transmitir Champions League. Eles querem comprar [direitos de transmissão] de times de Série B para quê? Não vão passar nada. Querem pegar para revender. Eles entraram bagunçando tudo, tiraram muito prestígio da Globo. Só que a Globo, muito inteligente, ficou com Flamengo e Corinthians, aí matou os caras. E o Bahia, no meu modo de ver, foi o único que fez errado. Não deveriam fazer seis anos. Fazia dois, como o Inter fez. Porque se ocorre qualquer zebra... Entendeu? Mas o Bahia fechou com seis. Por isso que a Globo falou que se for rebaixado, o valor cai para R$ 9 milhões, aí mata o clube. Ela ficou com raiva. Acho que quem está indo para o Esporte Interativo está tendo retaliações.
 
 
E sobre os jogadores das categorias de base que já recebem salários, eles também estão no radar de vocês?
 
Também. Todos já estão aqui. Já temos quatro pastas lotadas de homologações deles no arquivo. O atleta, quando faz 16 anos e assina o primeiro contrato profissional, já passa a fazer parte, já temos que olhar por ele, pois já tem todos os direitos. A partir dos 16 anos ele já se torna profissional. Antigamente, o jogador da base só podia ir para a seleção do estado se ele fosse amador. Hoje em dia não, ele pode ser profissional e com isso, pode ganhar mais. Melhorou para eles. Tem jogador da divisão de base do Bahia que ganha bem, mais do que muito jogador de clube pequeno. Nem se compara! O que ganha menos na base, ganha mais do que esses jogadores de time pequeno. Porque esses jogadores daqui, quando têm 14 anos, já recebem uma ajuda de custo, às vezes de R$ 800, e ainda tem comida, estudo, tudo pago pelo clube. Os atletas dos times pequenos ganham um salário mínimo e não tem alimentação, não tem nada.
 
 
Os clubes pequenos também atrasam os salários dos jogadores da base que disputam os campeonatos estaduais das categorias menores?
 
Ave Maria... Nem recebem. Não tem nada. Eles assinam, fazem a ficha federativa, porque não manda contrato para a CBF, ele fica federado e acabou. Jogam o campeonato sem ganhar nada. A não ser Bahia e Vitória, que realmente tem que fazer isso, porque eles tem o incentivo da Caixa Econômica, se não perdem, né? Tem também aquilo, se o jogador for embora, se roubarem o jogador dele, tem que pagar o percentual de formador do atleta. Nos times pequenos, se quiser pegar o jogador, pode pegar que não dá nada. É o risco que eles correm. E aqui para nós, a maioria perde todos os jogadores, porque eles trazem, começam a aparecer, aí vem o Bahia e chama, sem precisar dar satisfação para ninguém.
 
 
Em 2016, o Bom Senso, liderado por Paulo André e pelo ex-jogador Alex, chegou ao fim depois de três anos de atividade. Você chegou a conversar com eles, trocar ideias durante e depois que o Bom Senso esteve em atividade?
 
Somos totalmente contra o Bom Senso. Eles foram uma fraude, enganaram todo mundo. Nada mais eram do que jogadores milionários, liderados por milionários que estavam só pensando neles, interesse próprio, estavam pouco ligando. Não vou citar nomes. É como eu falo aqui para certos jogadores que ganham muito: "Rapaz, o sindicato não é só de vocês, tem os meninos também". Eles respondem: "Não quero saber dos outros, quero saber do meu". É esse o pensamento deles todos. O jogador quando está lá em cima, não quer saber de ninguém, só quer saber do dele. É bem diferente de antigamente. Quando eu estava lá no Bahia, o prêmio do campeonato era dividido até para os cozinheiros, as faxineiras. O bicho foi todo dividido. Aqui eles não ligam para nada. O cara até ajuda o colega de treino, se estiver treinando bem, mas infelizmente não é todo mundo que está no grupo. Então, só recebe prêmio quem está no grupo. O cara jogou aqui e ganhou um dinheirão, mas não tira 5% dele para dar para aqueles que não jogaram todas, que se contundiram. Eles não ajudam ninguém. O Bom Senso é a mesma coisa. Eles só estavam preocupados em ter a garantia de ter o direito de imagem pago. Aquilo tem que acabar, os jogadores colocam R$ 10 mil na carteira de trabalho e R$ 90 mil de direito de imagem. Para o clube, R$ 10 mil é CLT. Então, se o clube não pagar, o jogador entra na Justiça e vai receber. Mas não é todo o juiz que está dando os R$ 90 mil não, porque é imagem aí tem que dar nota fiscal. Queira ou não queira aquilo é para sonegar imposto, driblar imposto de renda, então ele está sendo conivente com tudo. O que o Bom Senso estava querendo era garantia de ter o direito deles de que tinha que pagar tudo. Eles só estavam puxando para o lado deles, tanto é que não foi para lugar nenhum. Porque quando [a ex-presidente] Dilma viu que aquilo era um grupo que só queria tirar proveito, cortou eles. Ela disse que era uma associação que ela não reconhecia e está certa! Eles usaram a imprensa. Eles gastaram muito e Paulo André não aguentou e saiu debaixo, porque gastava muito dinheiro. Banca o sindicato aqui para você ver, com toda a estrutura, contador...
 
 
FONTE: https://www.bahianoticias.com.br/esportes/entrevista/279-chance-de-jogador-ser-atleta-de-ponta-e-a-mesma-de-ganhar-na-mega-sena-diz-osni.html



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